Em 1899, Emília Freitas publicou sua obra com um pedido de desculpas aos intelectuais, principalmente aos escritores brasileiros, já prevendo as críticas que receberia pelo seu romance ousado para a época, no qual mulheres comandam todos os ramos de uma sociedade, inclusive governando-a. Estava ciente do ar inacreditável de sua obra, mas ainda assim a oferecia a quem tivesse o coração aberto para recebê-la das mãos de sua humilde (e sagaz) escritora.
Esse é um retrato que podemos fazer da autora cearense que, apesar de não ter inaugurado a literatura especulativa no Brasil, certamente sua utopia liderada por mulheres foi a pioneira no que costumam chamar de ficção científica feminista, uma vertente da ficção científica que lida com os direitos das mulheres na sociedade e que conta com nomes como Ursula Le Guin e Margaret Atwood. Essa era uma dentre as muitas lutas sociais a que Emília estava ligada e que permeiam suas obras, como o abolicionismo, o autoritarismo e a desigualdade socioeconômica, por exemplo, muitas das quais infelizmente continuam atuais.
Segundo Alcilene Cavalcante, Emília Freitas, filha do tenente-coronel Antônio José de Freitas e de Maria de Jesus Freitas, nasceu em 11 de janeiro 1855, em Passagem das Pedras, município de Aracati, no Ceará. Segundo nota de Otacílio Colares, Passagem das Pedras era um antigo distrito da cidade de Jaguaruna, no município de Aracati, e deve-se ao fato de o leito por onde se fazia a travessia do Rio Jaguaribe ser bastante pedregoso.
Após a morte do pai, a família mudou-se para a capital, onde Emília teve a oportunidade de estudar e formar-se professora. Foi poeta e romancista, tendo escrito para diversos jornais literários, dentre eles o Libertador e o Cearense. Em 6 de janeiro 1883, discursou e recitou poemas durante a fundação da Sociedade das Cearenses Libertadoras, ligada à causa abolicionista. Sua mãe faleceu em 1885, e em 1892 ela se mudou com o irmão para Manaus, onde foi professora do Instituto Benjamin Constant.
Casou-se em 1900 com o jornalista Arthunio Vieira e regressou ao Ceará. Tornou-se cofundadora do grupo espírita “Verdade e Luz” de Maranguape, Ceará, e publicou, junto ao marido, o jornal espírita Luz e Fé. Em 1901, retornou a Manaus, onde faleceu em 18 de agosto 1908, após a morte do marido.
De suas obras, temos notícias da coletânea de poemas “Canções do Lar” (1891), contendo seus poemas mais famosos, como “Conforto” (1875), “A mãe escrava” (1877) e “Um quadro” (1878) — este último, segundo Otacílio Colares, dedicado à memória do pai e dos irmãos João Batista, Cícero Cicinato, Carlos Augusto e Antonio Henrique, todos falecidos em um curto período de tempo —, e dos romances “O Renegado” (1892) e “A Rainha do Ignoto” (1899).
Bibliografia:
Cavalcante, Alcilene. Uma escritora na periferia do Império: vida e obra de Emília Freitas (1855-1908). Tese de doutorado em Literatura Brasileira, apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Letras: Estudos Literários da Faculdade de Letras da UFMG. UFMG: Belo Horizonte, 2007.
Valek, Aline. “Emília Freitas, pioneira na literatura fantástica brasileira”. In: Carta Capital [online]. Disponível em: www.cartacapital.com.br/cultura/a-mulher-que-inaugurou-a-literatura-fantastica-brasileira.